Sara Ramos integra DINÂMIA'CET-Iscte na RePEnSA, a rede constituída pelos Centros de Referência Portugueses na área do envelhecimento com o objetivo de repensar e implementar melhores respostas aos desafios demográficos
Qual a importância da constituição desta rede e que desafios pretende colmatar?
A população está a envelhecer um pouco por todo o mundo, em especial nos países ocidentais e mais intensamente na europa. Na origem desta alteração demográfica estão dois “movimentos”. Por um lado, o aumento da esperança média de vida, o que significa que as pessoas estão a viver mais tempo (embora nem sempre com menos doenças ou com mais qualidade e bem-estar), o que é um resultado da evolução da nossa sociedade, da melhoria das condições de vida no geral (alimentação, higiene, saneamento, educação) e dos avanços da medicina e do acesso aos cuidados de saúde; e por outro, um decréscimo acentuado da taxa de natalidade, também devido a muitos fatores de ordem social (o prolongamento da escolaridade, as dificuldades de estabilização no mercado de trabalho, a possibilidade de decidirmos quando queremos ter filhos, entre outros).
Portugal em particular, apresenta um ritmo de envelhecimento populacional acelerado, dos mais preocupantes entre os países europeus. Este envelhecimento coloca novos desafios à sociedade atual, quer na esfera da saúde (custos da doença, da medicalização, dos cuidados e da institucionalização dos idosos), da sociedade em geral (sustentabilidade da segurança social, o papel dos idosos e o valor que representam para a sociedade), quer ao nível do mercado de trabalho (a população ativa também está a envelhecer, o que coloca desafios também ao mercado de trabalho e ás empresas).
Portanto, se há umas décadas a preocupação era cuidar das crianças e jovens (evitar mortes, sobretudo a mortalidade infantil, educar e inserir os jovens no mercado de trabalho), hoje a atenção deve focar-se também nas fases de vida mais tardias. Foram criadas estruturas que permitiram apoiar os mais jovens (acompanhamento médico na gravidez e no parto, saúde infantil, vacinação, investimento na educação e na escolaridade obrigatória, estágios, programas e serviços de inserção na vida ativa, etc.), agora precisamos de criar estruturas que apoiem os mais velhos (estilos de vida saudável, adequação das condições de trabalho, transição para a reforma, acesso a cuidados de saúde, manutenção da autonomia, proteção na doença, etc.).
Como é constituída a rede, as entidades que a integram?
A RePEnSA (Rede Portuguesa para Envelhecimento Saudável e Ativo) é uma rede de Centros de Referência portugueses. É uma resposta original (porque é conjunta e colaborativa) a uma missão da Comissão Europeia, dedicada ao tema Health, demographic change and wellbeing. Foi assim criada a European Innovation Partnership on Active and Healthy Ageing, que procura promover e reconhecer estes centros de referência em todos os estados membros da UE (Reference Sites to scale up innovation for active and healthy ageing).
Em Portugal existem 4 centros de referência reconhecidos: Porto4Ageing, Ageing@Coimbra, Lisbon-AHA e Algarve Active Ageing e são estes 4 centros que constituem a rede. Estes ‘reference sites’ procuram ser uma ponte entre a academia, decisores políticos, sociedade civil e indústria e por isso estão associados a universidades, a empresas, a câmaras, no sentido de disseminarem soluções e tecnologias inovadoras para melhorar a vida de todos os cidadãos.
A matriz europeia é muito orientada para o ciclo de vida, isto é, para privilegiar soluções que não se foquem exclusivamente nos idosos, mas que considerem todo o ciclo de vida dos indivíduos. Porque para melhorar a vida dos idosos não podemos começar a agir apenas na fase de vida mais tardia, há um trabalho que deve começar muito antes, desde que nascemos. A parceria com o DC nasce precisamente daqui, com o convite que me foi endereçado pelo centro de referência do Algarve – Algarve Active Ageing. Os centros são, na sua maioria constituídos por profissionais da área da medicina e com um foco muito particular na saúde. O centro do Algarve partilha desta perspetiva de que devemos começar a agir mais cedo, evitando o envelhecimento
prematuro e promovendo uma longevidade o mais saudável possível. E aí aparece o trabalho, como um contexto privilegiado da nossa vida, com muita influência na forma como nós envelhecemos. É importante que uma ação concertada a vários níveis e o trabalho é um deles, é necessário adequar os contextos de trabalho tornando-os mais saudáveis e evitando uma deterioração prematura da nossa saúde. É nessa área que eu tenho investigado e o objetivo é poder contribuir para o trabalho da rede com aquilo que já sabemos sobre a relação entre envelhecimento, saúde e trabalho.
Como está estruturada a missão da rede?
A RePEnSA tem como tarefa principal consolidar a coordenação entre os centros de referência e a academia para melhorar a partilha de conhecimento na área do envelhecimento ativo e saudável, dar melhores respostas aos desafios demográficos e para promover iniciativas que aumentem a qualidade de vida das pessoas.
A rede tem já alguns projetos pensados, nomeadamente a criação de um observatório nacional para o envelhecimento que me parece um projeto muito ambicioso e de longo prazo, essencial para o diagnóstico de necessidades e para a avaliação do impacto das medidas. Só desta forma podemos saber o que se passa, que medidas são necessárias e que efeitos produzem essas mesmas medidas.
Outras iniciativas são focadas na gestão da doença crónica, na reabilitação funcional e cognitiva, na adaptação do espaço habitacional às necessidades dos indivíduos e na autonomia, e também medidas relativas à vida de trabalho. Como por exemplo a adaptação do trabalho ao longo da vida, considerando a evolução das necessidades das pessoas, a sensibilização e ação conjunta com as empresas para que adotem práticas internas que considerem o fator idade, ou uma transição gradual para a reforma. É nestas medidas relacionados com o trabalho que eu penso ter mais contribuição a dar e é onde o DC será um parceiro fundamental.
A rede foi apresentada formalmente no passado dia 12 de julho (foto abaixo), onde apresentámos a Senhora Ministra do Trabalho (MTSSS-Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social) um documento conjunto, escrito por todos, com as propostas da rede. Creio que este foi um passo muito importante, e em breve estaremos certamente a escrever propostas de ação muito concretas para serem implementadas ao nível nacional!
Para saber mais sobre a RePEnSA, pode visitar o website da rede: https://repensa.pt/
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